24 de out. de 2011

Um homem na estrada


Início do século XXI. A molecada que roletava pelos bares da Tamandaré e outros points “massas” nos movimentados anos 80 do século XX, no lombo duro de utilitárias com poses de esportivas, cresceu. Nevaram em seus cabelos. Outros cabelos não esperaram a neve. Uma barriguinha saliente acomodada no cinto, trabalho, contas a pagar. Entretanto, na garagem, merecidamente mais espaçosa, em lugar privilegiado e vistoso repousa um cavalo negro de aço e cromo. Uma ponte sobre rodas ligando o adulto responsável aos ventos da adolescência. Os ex-moleques da “motoquinhas barulhentas” são, agora, os respeitáveis malucos das máquinas cromadas.
Ideias arejadas, o médico João Batista Alencastro é o típico cavaleiro pós-moderno de roupa negra e DNA da saudosa Tamandaré que hoje desbrava as estradas e ruas do mundo. “Sou um menino, um jovem de 40 e poucos anos de idade”, depõe.
A primeira moto que o garoto João pilotou, com apenas 13 anos de idade, foi uma Honda CG125, a clássica e resistente motocicleta conhecida afetuosamente por “Burrão”. A modesta utilitária made in Zona Franca de Manaus também foi a responsável por apresentar o irremovível e duro chão ao ousado candidato a motociclista. “Aprendi a andar de moto com meu tio Rui, que, infelizmente, partiu em um acidente de moto”, emociona-se.
Entretanto, o coração goianiense de Alencastro bate em compasso alegre e acelera forte quando o veterano motociclista relembra das tardes e noites das décadas de 1970 e 1980 na louca Praça Tamandaré. “Foi uma fase extremamente agradável. Sábados e domingos divagando sobre máquinas no hotel e restaurante Papillon”.
À época, as máquinas que arrepiavam os cabelos dos braços de muito marmanjo dublê de piloto eram a Honda CB 400, a maior moto nacional, a Honda Gold Wind 1000, importada de 999 cc e motor quatro cilindros contrapostos, e a Honda CB 750Four, motor de quatro cilindros em linha, quatro escapamentos cromados, escolhida a “Moto do Milênio” em uma eleição promovida por várias revistas especializadas do mundo. “Eu não tive nenhuma dessas motos mas as amei profundamente”, entrega Alencastro.

Retão
Outro ponto de encontro da meninada que surfava em duas rodas era o retão do autódromo de Goiânia. “Confesso que frequentava e descia o retão do autódromo, deitado no banco e trocando a marcha com a mão esquerda. Como sou canhoto trocava a marchas com extrema rapidez”, sorri um sorriso adolescente. Contudo, se justifica. “Quando se é menino há o mágico pensamento de que nada acontece de ruim. Hoje eu ando devagar, com cuidado”. Tá bom, a gente acredita João Batista.
Acometido pelo vírus da estrada, em 1982, no lombo de uma Honda XLX 250 R vermelha, a máquina da fábrica japonesa que substituiu o “trator” XL 250, o aventureiro percorreu a costa nordestina. “A XLX era uma moto muito confiável e tinha um único defeito: o coice do pedal, que cobrava uma certa resistência da canela do piloto”, rememora com precisão.
Em 1999, na previsível e deliciosa companhia de uma Harley Davidson Dyna Glide, João Batista percorreu o sonho de 11 em cada 10 amantes de duas rodas: a Rota 66. “A paisagem geográfica dos EUA é belíssima: florestas, desertos, montanhas, Oceanos Pacífico e Atlântico. Rodei mais de 7.500 km nos EUA e não vi um buraco. É um cenário esculpido para motos estradeiras”, recorda com brilho nos olhos. “O caminho interior também é muito bonito. Refletir sobre a vida tendo como moldura a América profunda”, divaga.

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